Rádio Café – O fantasma da Vila parte 1
Por Mônica França - 7 de Outubro de 2020
Bem-vindo a nossa cafeteria mais uma vez. Escolha um lugar, faça um pedido e aprecie um conto conosco.
-Bom dia!
-Bom dia. Será que o rádio está funcionando hoje?
-Ainda não tentei ligar.
-Certo. Vou querer um expresso e um pão de queijo, por favor.
-Claro, já levo para você.
-Aqui está. Vou ligar o rádio. Hoje está sintonizando!
Voltamos com mais um Eu não tinha o que fazer e fui escrever com o quadro preferido de todos nós Conte seu conto. Você, querido ouvinte, que deseja participar com seu conto basta enviar um e-mail com um .pdf de seu texto. Lembre-se de nossos quatro selos temáticos Madness, Memories, Erotics e Horror. Hoje teremos a participação de Mei Lin Mei – parece que ainda não temos outros ouvintes rsrsrs – com o conto O fantasma da Vila parte 1 pelo selo Horror. Vamos a mais um Conte seu conto.
Mudei-me para a Vila de Paranapiacaba e com o passar do tempo me adaptei muito bem a esse lugar com jeito de vilarejo inglês. Tudo aqui gira em torno da ferrovia construída a alguns séculos pelos ingleses durante os tempos áureos da cafeicultura paulista. O turismo é essencial para a vida da vila e conta com atividades como a visitação aos trens antigos, prática de trilhas ecológicas, visita ao museu histórico, festival de inverno e outras atividades sobre as quais não me lembro.
Sou uma pessoa introspectiva e cultivo poucas amizades. Conheço apenas os comerciantes locais e a proprietária do casebre alugado no qual tenho passado os últimos dois anos. Certa vez, quando fui pagar o aluguel ela me orientou a ir logo para casa, pois passava das vinte e uma e trinta tornando-se a vila um lugar muito perigoso a partir das dez da noite. Nunca ouvira nada sobre a Vila ser perigosa a partir das vinte e duas horas, então, curiosa, perguntei o que ela queria me dizer. A senhora fez uma cara séria, arregalou os olhos e afirmou haver um fantasma de uma mulher vagando pela linha do trem e a vizinhança ao redor em busca de seu marido falecido durante a construção da ferrovia. Ela desapareceu para dentro de sua casa, dei de ombros sem levar aquilo a sério e fui para casa.
Uma rara lua cheia vermelha brindava a minha caminhada, por instinto olhei meu relógio e era vinte e cinquenta. Suspirei e apressei meus passos cujo eco na rua podia ser ouvido por mim. Soltei uma risadinha ao chegar em frente de casa, pois sabia que já era mais de dez da noite. Nenhum fantasma arrependido por aqui, pensei ao encaixar a chave na fechadura. Dei a primeira volta e junto ao familiar clique de abertura da trava ouvi um gemido como de um gato esganiçado. Lembrei da senhoria e sua advertência e sacudi minha cabeça para espantar os pensamentos medrosos. Dei a segunda volta na chave e abri a porta, assim que coloquei um dos pés para dentro ouvi um gemido mais alto e desesperado do que o anterior.
Com o corpo quase totalmente dentro de casa, arrisquei olhar para a rua escura por cima do ombro. Não vi nada além da conhecida escuridão atravessada pelos poucos postes de luz noturna. Fechei a porta e ao trancá-la ouvi um som parecido com alguém gritando “cadê”. Um arrepio estremeceu minha espinha e fui direto para cama adormecendo em seguida. O suor molhara minha camisola e meu coração estava descompassado. Com a respiração curta e acelerada, organizei os pensamentos e percebi que havia despertado de um pesadelo. Uma mulher de uns trinta anos vinha em minha direção de um jeito assustador. Essa era a única lembrança que eu tinha do pesadelo. Ainda era quatro da manhã, mas eu estava agitada o suficiente para não conseguir mais dormir. Conforme amanhecia, a mulher do meu sonho ficava irreconhecível, contudo, sua presença inacessível me consumia.
E terminamos mais um Conte seu conto. Agradecemos a participação de Mei Lin Mei e aguardamos a parte dois de seu conto. E esse foi o Eu não tinha o que fazer e fui escrever de hoje. Até nosso próximo encontro, queridos ouvintes e escritores.
-Já terminou? Estava bom?
-Estava ótimo com sempre.
-Escreveu mais algum conto?
-Estou trabalhando em um. Você gostaria de ler quando eu terminar?
-Claro.
-Então até outro dia.
-Até.